bedwetter - volume 1: flick your tongue against your teeth and describe the present. (Resenha)



“OBLIVION ACCESS IS THE LAST OF THE FILTHY WATER FUNNELING OUT OF THE BATHTUB I'VE BEEN SOAKING IN FOR 5 YEARS. IT'S ALL THE SHIT AND CUM AND BLOOD AND PISS AND SWEAT AND FLAKES OF DEAD SKIN AND HAIR COLLECTING BY THE DRAIN. TOO THICK AND CLOTTED TO FIT THROUGH THE TRAP. YOU HAVE TO DIG YOUR HANDS IN IT AND FUCKING DEAL WITH IT. YOU HAVE TO PICK IT UP AND SMELL IT WHEN IT'S TIME TO CLEAN UP."

O quote acima é de autoria de Lil Ulgy Mane (Travis Miller), sobre seu álbum Oblivion Acess. A imagem não é muito agradável, não é mesmo? Mas é bastante realista. Em seu novo projeto, sob o pseudônimo de bedwetter, as coisas não parecem muito melhores. Lil Ulgy Mane ainda parece estar na mesma banheira, afundando em desgosto e depressão, para usar palavras mais delicadas.

Depois da estranha introdução, que já cria uma clima sombrio ao álbum ao loopar a frase “In the beginning was the word/ And the word was with God” dita por uma voz quase robótica, vem a música que é simplesmente uma das mais finas uniões de storytellying e emoção que eu já ouvi. Nas primeiras linhas Travis pinta a imagem de uma criança comum, brincando inocentemente em seu quintal, até que então, abruptamente, ela é enfiada dentro de um caminhão e o pesadelo começa. Narrando todo o desespero da criança em terceira pessoa (“Home is who they took him from and he don't know who's taken him/ Puffy eyes, pissed pants, sore throat, scream like a whisper”) ele cria uma ilusão de distância, como se a história fosse parar por aí. Mas, em uma virada brusca, nos é confessado que a criança é o narrador da história (“Against these monsters in this crypt, in this hidden jail/ All this time passed, I'm still scared that I'm there still)”. A revelação transforma a história em outra; não se trata de um sequestro literal de uma criança qualquer, mas sim do sequestro de Travis por um mundo cruel e abusivo. Na faixa seguinte,“Stoop Lights”, há uma linha bastante reveladora para essa questão: “Mind on liquor, now my mind half gone/ Mind half gone, 'cuz I wish I had a family/ Family ain't here, 'cuz I been living wrong”. Ele é a criança chorando no caminhão, sentindo saudades de sua infância, de sua família, de uma vida pacata e tranquila que lhe foi roubada pela vida adulta ou, talvez, em uma crise de culpa, por suas escolhas. Grande parte do êxito da música em sua condição catártica deve à excelente produção, na qual o encarregado também é Travis. A música começa de maneira calma, sem percussão, com um clima nublado e de desconfiança, mas cresce muito no seu decorrer, explodindo na hora certa junto com o refrão.

O resto do álbum segue pela mesma estrada de introspecção e frieza, movendo-se por passagens instrumentais de altíssimo nível, sempre visando manter o clima obscuro do trabalho. Outro grande ponto do disco é a faixa “Haze Of Interference” que começa com o sample mais inesperado que já ouvi em um disco de rap. O sampleado é ninguém menos que Jandek, conhecido por ser um dos nomes mais representativos da chamada outsider music. Mas, conhecendo toda a carreira de Lil Ugly Mane e tendo chegado até esse ponto do álbum, não é difícil imaginar que o rapper já tenha passado algumas madrugadas ouvindo o blues irregular de Jandek. A voz notívaga do outsider se encaixa perfeitamente na música, ajudando a criar uma paisagem ainda mais aterradora. Nada é deixado para trás na música, o rapper compartilha seus pensamentos mais obscuros e fala abertamente sobre sua depressão e sua visão cinza do mundo. "Drifting, floating up the stream, eyes are just a sucker's screen/ The Earth and how I see it are the rocks that I've been crushed between".

As últimas duas músicas do álbum são passagens bastante atmosféricas e tristes. Na última música há uma breve e bonita melodia de piano, acompanhado de um inocente murmurio e um som que parece de um trem, deixando uma imagem de conforto, mas ao mesmo tempo de distância, lembrando que talvez as coisas não melhorem tão cedo, mas que há sempre espaço para escape na nostalgia de um passado mais pacífico e bonito.


9/10.                             

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